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Schumann

Robert Schumann: entre a genialidade e a loucura

Poucos artistas encarnaram tão bem os ideais do romantismo melancólico como Robert Schumann. Em sua obra, fica evidente o pessimismo profundo, influenciado por Byron, e os grandes dramas que viveu. Schumann correspondeu aos parâmetros do romantismo, nos quais amores impossíveis se alternavam com insanidade, delírios e atração pela morte.

Robert Schumann

Considerado o maior compositor do Romantismo alemão, Robert Schumann nasceu na Saxônia em 8 de junho de 1810, na casa que hoje é o museu Schumann-Haus, em Zwickau.

Robert Schumann

Foi o quinto e último filho de um livreiro e romancista, August Schumann, e Johanna Schumann. O pai, desde cedo, permitiu que lesse as obras de Schiller, Goethe, Shakespeare, Lord Byron, E. T. A. Hoffman, Walter Scott e Jean Paul Richter – escritor que admirava a ponto de, em 1828, empreender uma peregrinação a Bayreuth para visitar seu túmulo -, autores que compuseram a base de sua formação e fontes permanentes de inspiração.

Aos 7 anos tomou as primeiras aulas de piano e escreveu suas primeiras composições, além de redações, poesias e fragmentos de romances. Quando percebeu que tocava melhor que seu professor, resolveu continuar os estudos de piano como autodidata.

Após a morte do seu pai, em 1826, quando ele tinha apenas quinze anos, sua mãe instou-o a graduar-se em Direito em Leipzig, cidade de Johann Sebastian Bach.

Schumann acatou as ordens da mãe, mas não suportou o curso. Em carta destinada a ela, o jovem confessa suas verdadeiras aspirações: “Cheguei à conclusão de que, com trabalho, paciência e um bom professor, seria capaz de ultrapassar qualquer pianista, num prazo de seis anos. Além disso, tenho imaginação e talvez habilidade para um trabalho de criação individual”.

O fato de ter conhecido a pianista Ignaz Moscheles e o fascínio exercido por Niccoló Paganini acabaram por determinar sua paixão pela música.

O professor escolhido foi Friedrich Wieck, para cuja casa, com a promessa de deixar de fumar charutos e embebedar-se, Schumann se mudou em outubro de 1830. Ali conheceu Clara, filha do mestre, pianista-prodígio de apenas 11 anos de idade, com quem, nos anos seguintes, iniciou um romance. O professor não aprovou o namoro dos dois, pois Schumann era dos mais pobres e menos promissores de seus alunos.

Durante esse período, também estudou composição com Heinrich Dorn, mestre de capela da catedral de Leipzig, apesar de, segundo suas próprias palavras, não gostar das “áridas escolas do contraponto e da harmonia”. Por conta disso, sua principal influência composicional foi a análise das obras de Mozart, Schubert e Beethoven, dentre outros.

Schumann apaixonou-se perdidamente por Clara, dedicando várias de suas obras a ela. O antigo professor, que a havia criado para ser uma virtuose do piano, tentou impedir essa ligação utilizando todos os meios à sua disposição. Wieck enviou a filha para uma turnê pela Europa, enquanto acusava Schumann de ser alcoólatra e demente.

Schumann

Ambicioso e com pressa em adquirir virtuosidade, Schumann resolveu utilizar o quiroplasto – aparelho em moda à época utilizado por Wieck – com a finalidade de desenvolver o movimento do quarto dedo, o menos independente dos dedos do pianista.

O uso do aparato, combinado a uma média de sete horas de estudo por dia, causou grave inflamação dos tendões e paralisia total do terceiro dedo da mão direita. Além disso, por ter contraído sífilis, por volta de 1830, Schumann se submetera ao tratamento então em voga: mercúrio e arsênico, o que também lhe trouxe sequelas.

Os tratamentos utilizados – “banhos animais” (inserção das mãos em carcaças de animais recém-abatidos), choques elétricos e dietas experimentais – também não foram muito eficazes, decretando o fim da carreira de Schumann como virtuose, em 1832.

Ao mesmo tempo, Schumann tornou-se conhecido como crítico musical. Em 1834, em conjunto com amigos e intelectuais da época, fundou o Neue Zeitschrift für Musik (Nova Revista para a Música), jornal em que publicava artigos sobre os principais compositores e intérpretes alemães da época, existente até hoje.

Seus principais colaboradores, uma irmandade de artistas denominada originalmente como Davidsbündler (Companheiros de Davi), eram frequentadores do Kaffeebaum de Leipzig, ponto de encontro e de efervescência criativa: o pintor Lyser, o concertista Schunke e os maestros Felix Mendelssohn e Richard Wagner, tendo ainda Berlioz e Liszt como colaboradores.

Por conta da impossibilidade de tornar-se concertista, Schumann passou a se dedicar cada vez mais à composição. Uma de suas obras-primas, “Carnaval”, foi composta quando ele contava 25 anos.

Após um longo conflito judicial, que só terminou em 1840, quando a moça completou 21 anos, Schumann conseguiu, nos tribunais, permissão para se casar com Clara Wieck.

Por conta dos escassos rendimentos dele como redator do Jornal da Música e como professor de piano, coube a ela manter a família como pianista virtuose com turnês pelas cidades europeias.

Esse relacionamento, além de oito filhos, rendeu 20 mil cartas trocadas. O casal viveu por quatro anos em Leipzig, tempo inspirador para Schumann que compôs diversos ciclos de canções, quartetos de cordas, peças pianísticas, as primeiras sinfonias e o Concerto para piano em Lá menor, entre outras obras.

A popularidade de sua música, no entanto, era restrita: Beethoven e Chopin correspondiam mais ao gosto da época, e mesmo sua esposa executava suas obras, no máximo, como “bis” em seus recitais.

A fama de Clara como virtuose crescia mais rapidamente que a dele como compositor. Tratado como “o marido da pianista”, sofreu com crises de depressão e, posteriormente, começou a sentir alucinações e surtos psicóticos. Os primeiros sintomas da perturbação mental de Schumann começavam a surgir.

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Em 1843, a convite de Mendelssohn, foi contratado para o cargo de professor de composição no primeiro conservatório alemão, em Leipzig. Viajou depois para a Rússia em companhia da esposa e, quando voltou à Alemanha, os distúrbios psíquicos revelaram-se cada vez mais graves.

Decidiu morar em Dresden e, posteriormente, em Düsseldorf, onde foi Diretor Musical de Orquestra a partir de 1850. Schumann não se adaptou às pressões do cargo e os sintomas de depressão e alucinações se tornaram cada vez mais graves: frequentemente passava noites em claro, queixando-se das peças musicais inteiras que lhe retumbavam na mente ou da nota Lá que ouvia intermitentemente, o que lhe perturbou profundamente.

Foi forçado a renunciar ao cargo em 1854, por causa do avançado estado de sua doença mental, agravada por uma séria inflamação de ouvido, que o afligia desde pequeno. Apesar de tudo, um terço de sua obra foi composta durante os quatro anos vividos em Düsseldorf.

Com a visita do jovem pianista e compositor Johannes Brahms aos Schumann, nasceu uma amizade profunda e duradoura. Robert afundava, contudo, cada vez mais num estado de confusão mental.

Deprimido, as ideias de suicídio passaram a ser insistentes. Em 27 de fevereiro de 1854, atirou-se no Rio Reno. Foi salvo por um grupo de barqueiros, mas, por vontade própria, foi internado logo depois em um manicômio em Endenich, próximo a Bonn.

Foi diagnosticado com “melancolia psicótica” e morreu em 29 de julho de 1856, sem ter se recuperado de sua doença mental, ao lado de sua esposa e do amigo Brahms. Clara Schumann retomou a carreira de pianista, falecendo aos 77 anos em Frankfurt.

A obra de Robert Schumann

Schumann

Schumann conquistou um espaço especial empenhando-se tanto nas composições de inúmeras e singelas lieder quanto elaborados concertos para piano e orquestra, estudos, ousadas sinfonias (“da Primavera”, “Renana”, “Fantasia sinfônica”) e uma ópera (“Genoveva”). Em um de seus anos mais produtivos, 1840, ele compôs 168 lieder, boa parte delas apresentadas ao público pelo amigo e também compositor Felix Mendelssohn, regente da Gewandhaus, a magnífica sala de espetáculos de Leipzig.

Sua criação artística, no entanto, se realizou de forma inconstante: muitas obras de valor em curto espaço de tempo, seguidas de intervalos de produção menos importante. Em menos de três anos, o compositor criou suas melhores obras pianísticas, altamente românticas e poéticas, só comparáveis às de Chopin.

Schumann criou formas pianísticas próprias, geralmente pequenas peças que formam um conjunto de grandes dimensões e exige do pianista muito investimento técnico e emocional.

 Entre as características mais marcantes de sua produção, destacam-se as texturas polifônicas e contrapontísticas, com simultaneidade de linhas melódicas por vezes fragmentadas, além da polirritmia, reflexos da mente do compositor.

À crítica de que compunha sonatas em formas não ortodoxas, Schumann teria respondido: “Como se todas as imagens mentais fossem subordinadas a uma ou duas formas! Como se cada obra de arte não tivesse seu próprio significado e, portanto, sua própria forma!”.

“Papillons”, Opus 2, escrito em 1831, é um excepcional exemplo da fusão entre literatura e composição musical de Schumann. É uma composição para piano, composta por 12 cenas de dança inspiradas por uma festa à fantasia, cada uma retratando personagens.

“Fantasiestücke” Op. 12 (Peças Fantásticas), de 1837, é a mais romântica de todas as obras de Schumann e merecem a consideração de trabalho de capital dentro do conjunto da produção do piano romântico. É uma das obras mais populares do repertório do compositor.

Os “Symphonic Studies” Op. 13 (Estudos sinfônicos), de 1834, é uma de suas melhores e mais pessoais obras. Concebido como um verdadeiro estudo do virtuosismo (não tanto da mecânica mas da musicalidade), os Estudos Sinfônicos estão a meio caminho entre os de Chopin e os de Liszt.

“Kinderszenen” Opus 14 (Cenas Infantis), de 1838, é uma das mais belas peças musicais já escritas.  Trata-se de um conjunto de treze pequenas composições para piano, com título e identidade diferentes para cada uma, mas nascido com uma unidade de motivação: Schumann queria dedicar à sua amada Clara Wieck.

O título não faz alusão a nenhuma criança, mas ao próprio Schumann, a quem Clara havia dito que “às vezes você se parece com uma criança”. A escrita é variada, a partir de linhas melódicas cristalinas, em contraponto, sempre com dinâmicas e texturas contrastantes. É deste ciclo “Reverie” (“Traumerei”), talvez a mais conhecida obra do compositor.

Para os jovens, Robert Schumann escreveu, em 1848, o seu “Álbum para a juventude”, Opus 68, trabalho que dedicou a uma de suas filhas quando completou sete anos. O álbum terminou de ser escrito em setembro desse ano, e teve anotações nas margens. Essas anotações foram aquelas que, ao longo do tempo, se tornaram as famosas “Regras musicais para a vida e a casa”, um total de 68 aforismos cujo conteúdo gira em torno da criatividade artística em geral, e a música em particular, e que também são dirigidas aos jovens.

“Waldszcenen” Opus 82 (Cenas da Floresta), composta por Robert Schumann entre 1848 e 1849, é dividida em seções, com títulos que, originalmente, aludem à floresta e à caça, mas para publicação o compositor decidiu removê-los.

O trabalho é programático, mas de acordo com Schumann, “não pretende denotar uma floresta conhecida pelo compositor, mas os múltiplos estados da alma dentro do quadro de uma floresta fantástica, macabra e misteriosa”.

Schumann também aborda a grande forma no piano e compõe, a Grande Sonata No. 1 em Fa menor Opus 11 (1835), a Sonata No. 2 em Sol menor Opus 22 (1833-1835), e a Grande Sonata No. 3 em Fa menor, Opus 14 (1835).  A terceira delas sonatas é intitulada Concerto sem Orquesta e, originalmente, consistia em uma sequência de cinco movimentos.

Robert Schumann não foi devidamente reconhecido em vida. Apenas depois de sua morte tornou-se um dos compositores mais queridos do público, influenciando César Franck, Alexander Borodin, Antonin Dvorak e Edvard Grieg.

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