Estique uma corda de aço e faça-a vibrar. Com certeza, o que se ouve é muito pouco em relação à sonoridade de um piano. Prenda essa mesma corda em uma caixa de madeira e veja como a vibração da corda é amplificada e já se consegue ouvir algo como uma nota musical.
Esse é o princípio da caixa de ressonância, um arcabouço que amplifica a vibração do ar produzida pela corda tangida fazendo-a audível, utilizada em praticamente em todos os instrumentos de cordas.
Em um piano, todo o móvel do instrumento funciona como caixa de ressonância, mas a “alma” da sonoridade está na tábua harmônica, responsável pela transferência da energia vibratória da corda para o ar.
A função da tábua harmônica em um piano é amplificar as vibrações produzidas pelo movimento das cordas, formando no ar ondas sonoras de amplitude e potência muito maiores das que poderiam ser geradas apenas pelas cordas.
Isso pode ser facilmente entendido ao comparar a grande área da tábua harmônica em relação a todas as cordas juntas, fazendo que a grande porção de ar que envolve as superfícies frontal e traseira da tábua harmônica libere as poderosas ondas sonoras geradas pelo complexo movimento.
Uma das partes acústicas fundamentais de um piano, a tábua harmônica deve apresentar propriedades bastante interessantes: equilíbrio perfeito entre flexibilidade e rigidez, robustez e resistência à deformação.
A qualidade do timbre de um piano está diretamente relacionada à qualidade e ao estado dela, e, por conta das inúmeras variáveis existentes ao longo da fabricação desse componente, não há dois pianos com som idêntico, pois cada peça construída é única.
Composição da tábua harmônica
Estruturalmente, a tábua harmônica é uma grande membrana de madeira, cujo desenho caracteristicamente curvilíneo nos pianos de cauda – situada por baixo das cordas – e retangular nos pianos verticais – por trás delas -, é definido pela forma da chapa.
A espécie de madeira utilizada para a tábua harmônica, assim como sua espessura e fixação irão determinar as características do timbre do piano. Madeiras mais duras vibram mais ao passo que as mais moles absorvem as vibrações.
Nos instrumentos de melhor qualidade, a tábua harmônica é fabricada de madeira maciça, tradicionalmente proveniente de árvores coníferas, os pinheiros, cujos variados nomes dependem da região e do tipo, como, por exemplo, Pinho do Paraná (Araucária), Spruce, Sitka e Abeto, entre outros.
Depois de cortada, a madeira é selecionada e colocada no processo de secagem natural por alguns meses, até que esteja em condições de entrar para secagem em estufas automatizadas. O resultado desse processo é uma matéria-prima estável e isenta de fungos.
Para a construção da tábua harmônica, tábuas de madeira maciça são coladas lado a lado por suas bordas por artesãos habilidosos, até que se obtenha o tamanho desejado, dependendo do modelo do piano, sendo que os veios da madeira devem estar o mais paralelo possível à linha do cavalete principal, onde estão apoiadas as cordas. A espessura das peças varia de 6 a 8mm, em média, das bordas para o centro.
A riqueza do som de um piano está relacionada ao efeito chamado coroamento, uma leve curvatura que o artesão confere à tábua harmônica no processo de montagem, fazendo que ela atue como um diafragma, propagando o som produzido pelas cordas, e suporte a tensão que as cordas exercerão sobre a sua superfície.
Para equilibrar os esforços produzidos e direcionar energia aos pontos em que a tábua harmônica é mais exigida, são coladas costelas de madeira em sua parte traseira. Nos pianos de melhor qualidade, essas costelas são fabricadas de madeira maciça, sem emendas. Sobre ela também são colados os cavaletes: um para apoio das cordas da região dos médios e agudos, e outro para apoio dos graves. A função dos cavaletes, fabricados de madeira maciça de grande dureza e entalhados por artesãos altamente qualificados, é transmitir as vibrações das cordas para a tábua harmônica.
Por fim, a tábua harmônica é fixada em uma complexa e sólida estrutura de madeira e ferro fundido, formando um elemento coeso, estável, capaz de suportar as mais de 20 toneladas de esforços produzidos pelas cordas tensionadas, garantindo a qualidade dos sons emanados pela tábua harmônica e mantendo a afinabilidade do instrumento.
Tábua harmônica e seus problemas
Nos instrumentos de melhor qualidade, observados os cuidados de manutenção, a tábua harmônica não deve trazer problemas. No entanto, como se trata da “alma” do piano, certos cuidados são necessários e o bom estado da peça garante a qualidade da sonoridade do instrumento.
Um dos grandes vilões de qualquer instrumento musical é a variação extrema em termos de umidade e temperatura. Por se tratar de uma peça de madeira, a tábua harmônica também sofre influência desses fatores e, em pianos antigos, é comum que esteja rachada, o que faz o instrumento perder a qualidade e o volume de sua sonoridade, produzindo uma série de vibrações indesejáveis, facilmente perceptíveis.
Além disso, nesses instrumentos, a falta de cuidados, o mau uso, o tempo e condições extremas podem levar ao descolamento das costelas. Esses problemas podem ser facilmente detectados, tanto visual quanto auditivamente, e um profissional competente e habilitado pode avaliar o quanto a peça foi comprometida.