Pianista clássico dos mais emblemáticos do século 20, Arthur Rubinstein foi um personagem muito diferente do padrão dos virtuoses de sua época. Elegante, poliglota e divertido, viveu para a música, não atuando somente como concertista e recitalista, mas também se dedicando às obras de câmara. Durante sua carreira, colaborou com músicos do porte de Jascha Heifetz, Gregor Piatigorsky, Henryk Szeryng, Emanuel Feuermann, Pierre Fournier e o Quartet de Guarneri, entre outros.
Nascido em Lódz, na Polônia, em 28 de janeiro de 1887, naturalmente tornou-se a personificação, no século 20, da música de Chopin, interpretando as composições do compatriota com paixão e retidão. Embora tenha gravado a maioria das principais obras de Chopin várias vezes, Rubinstein também registrou um vasto repertório que conta com peças de Mozart, Beethoven, Schubert, Mendelssohn, Schumann, Liszt, Grieg, Tchaikovsky, Saint-Saëns e Brahms, assim como Albéniz, Falla, Granados, Fauré, Franck, Debussy, Ravel, Rachmaninoff, Stravinsky, Szymanowski, Villa-Lobos, Prokofiev e Poulenc, o que dá uma ideia de sua capacidade interpretativa da música de diferentes períodos.
Arthur Rubinstein era o sétimo filho de uma família de tecelões judeus. Enquanto sua irmã mais velha recebia aulas de piano sem manifestar maior interesse, Arthur, com somente 3 anos, tentava reproduzir no instrumento as melodias que ouvia. Aos 6, tocou em público pela primeira vez. Ingressou no Conservatório de Varsóvia aos 8, onde foi aluno de Paderewski e Ludomir Różycki. A partir de 1898, o violinista Joseph Joachim o toma sob sua proteção e o envia a estudar em Berlim, recomendando-o ao professor Heinrich Barth. Durante a adolescência não frequentou colégio algum, porém seu professor lhe proporcionou uma cultura tão sólida que, aos 14 anos, lia textos em polonês, russo, francês, inglês e alemão.
Em 1904, viajou a Paris, onde se encontrou com Maurice Ravel e Paul Dukas e interpretou o 2º Concerto para Piano de Saint-Saëns, na presença do compositor. Em 1906, apresentou-se em Nova York como solista da Orquestra de Filadélfia, o que representou o início de sua carreira internacional, com apresentações em Itália, Rússia, Austrália, Grã-Bretanha, entre outros países. De volta à Europa, passou a atuar como professor, mantendo residência em Paris. Durante a Primeira Guerra Mundial, atuou como intérprete militar em Londres, apresentando-se em duo com o violinista Eugène Ysaÿe.
Em 1916 visitou a Espanha, onde apresentou composições de Granados e Manuel de Falla, que lhe dedicou a “Fantasia Bética”. Em 1919 veio ao Brasil, e conheceu Villa-Lobos, interessando-se pelas modernas composições do brasileiro e sendo um dos grandes responsáveis pela divulgação de suas composições. Em sua homenagem, Villa-Lobos escreveu “Rudepoema”, em 1926.
Nos anos 30, o pianista passou a gozar de renome internacional e, em 1932, casou-se com Anelia Mlynarska, bailarina, poliglota e dotada de múltiplos talentos. A partir de então, renovou sua técnica e, depois de algum tempo dedicado a intensivos estudos, apresentou-se nos Estados Unidos em 1937. Durante a Segunda Guerra Mundial, mudou-se para lá e, em 1946, obteve a cidadania americana. Terminada a guerra, recusava-se a tocar em solo alemão, pois havia perdido membros de sua família nos campos de extermínio. Todavia, daria concertos em cidades próximas às fronteiras da Alemanha para o povo alemão que apreciava sua arte.
Em 1954, voltou a fixar-se em Paris, na Avenida Foch, na mesma casa em que morava antes da guerra e que havia sido requisitada pela Gestapo durante a ocupação. Arthur Rubinstein se orgulhava de sua herança, muitas vezes colocando sua arte a serviço de causas judaicas e polonesas – inclusive na inauguração das Nações Unidas em 1945. Continuou a percorrer o mundo durante mais 30 anos, apesar de um princípio de cegueira que se manifestou em 1975. Seu último concerto foi em Londres, em 10 de junho de 1976, quando já estava com 89 anos, na sala de espetáculos Wigmore Hall, onde tocou pela primeira vez quase 70 anos antes.
No fim de sua vida, escreveu uma autobiografia em dois volumes: My Young Years, lançado em 1973, e My Many Years, lançado em 1980. Arthur Rubinstein morreu em dezembro de 1982, em Genebra, na Suíça, mas será lembrado não só pela técnica soberba, o toque refinado e a alegria, mas também pelo seu humor, suas incontáveis histórias e suas frases de efeito. Uma delas, endereçada a amigos em relação a seu empresário: “Não conte a ele, mas gosto tanto de tocar piano, que me apresentaria de graça!”.