Falecida precocemente, com poucas obras editadas, Esther Scliar não é devidamente lembrada hoje. Mas grande parte da preocupação da pianista, maestrina, compositora, musicóloga e professora brasileira era com a educação musical, terreno em que detectava deficiências primordiais.
Por conta disso, resolveu criar um sistema mais completo, rico, criativo e básico da teoria e da análise musical, buscando abranger todos os estilos de várias épocas, sem nunca esquecer de dedicar uma parte à música brasileira. Soube encaminhar gerações de artistas para um estudo sério, crítico, das diversas fases da música, especialmente na área da música contemporânea.
Biografia
Esther Scliar nasceu em Porto Alegre a 28 de setembro de 1926, mas passou os primeiros anos de vida em Rivera, no Uruguai. Estudou em Santana do Livramento em virtude da deportação da mãe, em 1930, por motivos políticos.
No ano seguinte, no entanto, sua mãe abandonou a família, fato do qual Esther, então com cinco anos de idade, jamais se recuperou. A família, então, se mudou para Passo Fundo, e Esther e sua irmã, Leonor, foram entregues aos cuidados de tios, Jayme Kruter e Rosa Scliar Kruter, irmã de seu pai.
Início da sua relação com a música
Ali Esther manifestou o talento musical. Em 1934, iniciou o estudo do piano com Eva Kotlhar, em Passo Fundo, prosseguindo com Judith Pacheco. Após novo casamento do pai, os Scliar retornaram, em 1938, para Porto Alegre.
Esther continuou com os estudos no curso superior de música do Instituto de Belas Artes de Porto Alegre (atual Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul) onde foi aluna, dentre outros, de Paulo Guedes, Enio de Freitas e Castro e Demóstenes Xavier. Em 1945, diplomou-se em piano e, no ano seguinte, ingressou no curso de composição do mesmo instituto e passou a lecionar piano.
Em 1948, com o objetivo de estudar contraponto, harmonia e composição com Hans-Joachim Koellreutter, professor que exerceu influência decisiva em sua formação, Esther se mudou para o Rio de Janeiro e, logo em seguida, viajou para Veneza como bolsista do Corso Internazionale di Direzione do XI Festival Internazionale di Musica Contemporanea, ministrado por Hermann Scherchen.
Frequentou o I Curso Internacional de Composição Dodecafônica, ministrado por Koellreutter, em Milão, promovido pelo II Diapason, Centro Internazionale di Musica Contemporanea, e participou do Congresso de Música Dodecafônica em Locarno, na Suíça.
Retorno ao Brasil
No ano seguinte, retornou ao Rio de Janeiro, prosseguindo seus estudos de composição com Koellreutter, e, em São Paulo teve aulas de piano com Eunice Katunda e José Kliass. A partir de 1951, passou a residir em Porto Alegre com sua irmã, ministrando aulas particulares de piano, teoria e harmonia e atuando como pianista da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre.
Fundou e se tornou a primeira regente do Coro da Associação Juvenil Musical de Porto Alegre, em 1952, que mais tarde, com Madeleine Ruffier, se transformou no Coral de Câmara da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Em Montevidéu, estudou técnica de regência coral com Nilda Müller e foi pianista da soprano Vera Janacópulos.
Esther retornou ao Rio de Janeiro em 1956, cidade em que residiu definitivamente, e, até 1958, ficou sob orientação de Claudio Santoro, ao mesmo tempo em que se dedicou ao ensino de teoria musical, percepção e análise. Trabalhou como pianista acompanhadora do Coral Pró-Música do Rio de Janeiro até 1959.
Em 1960, concluiu o curso do Conservatório Nacional de canto orfeônico, no Rio de Janeiro, onde teve aulas de composição com Edino Krieger. Nesse mesmo ano, compôs a “Sonata para Flauta e Piano”, uma de suas obras mais conhecidas. Compôs no ano seguinte a “Sonata para Piano” e recebeu, com essa obra, o 1º Prêmio no Concurso Nacional de Composição do programa Música e Músicos do Brasil, promovido pela Rádio MEC.
Presença e importância de Esther para o Brasil
A partir de então, a presença de Esther Scliar na vida cultural do País se tornou assídua, compondo, regendo ou dirigindo a parte musical de diversos espetáculos teatrais e filmes, trabalhando ao lado de diretores como Paulo Afonso Grisolli, Yan Michalski, Mário Fiorani, entre outros.
Lecionou teoria musical, percepção, análise, morfologia e didática do ensino musical nos seminários de música Pró Arte do Rio de Janeiro, onde passou a ser coordenadora das matérias teóricas, atividade que desenvolveu até 1976, e conquistou respeito e importância, se destacando pelo seu trabalho e sendo responsável pelo desencadeamento de uma consciência mais sólida sobre a importância da formação de qualidade em música no Brasil.
Além disso, trabalhou como jurada em concursos de composição e ministrou cursos promovidos nas cidades de Curitiba, Brasília, Ouro Preto e Teresópolis.
Alunos consagrados de Esther
Soube encaminhar gerações de artistas para um estudo sério, crítico, das diversas fases da música, especialmente na área da música contemporânea. Consequentemente, muitos de seus alunos acabaram por se tornar personalidades reconhecidas, como Milton Nascimento, Paulinho da Viola, Paulo Moura, Luiz Eça, Hélcio Milito, Egberto Gismonti, Vânia Dantas Leite, Paulo Dorfman, Ronaldo Miranda, Flávio de Oliveira, Guilherme Bauer e Marco Antônio Araújo, entre outros.
Pesquisadora, Esther Scliar tinha uma visão inovadora do aproveitamento do folclore em suas obras, sem abandonar as técnicas de composição cultas. Escreveu música coral – tendo como base sua experiência como regente de coro em Porto Alegre – e poucas obras instrumentais, para diferentes formações. As principais são “Imbricata” (1976), “Intemorfoses” (1977), “Sonata para piano” (1961) e o “Estudo n.1 para violão” (1976).
Foi classificada como compositora da segunda geração pós-nacionalista, ao lado de Osvaldo Lacerda, Edmundo Villani-Côrtes, Kilza Setti e Brenno Blauth. No dia 18 de março de 1978, Esther Scliar, aos 51 anos, faleceu.
Sem publicações em vida, Esther teve livros póstumos lançados, com destaque para “Fraseologia Musical” (1982), “Elementos de Teoria Musical” (1985), “Análise de Density 21,5 de Varèse” (1985) e “Solfejos Gradativos” (1985).