Um dos objetivos de todos aqueles que iniciam o estudo do piano é ter a capacidade de “tirar músicas de ouvido”, ou seja, ouvir uma música e conseguir reproduzi-la no instrumento, sem fazer uso de partitura ou qualquer outro tipo de notação musical. É uma prática muito comum entre músicos amadores e profissionais.
Obviamente, os cantores têm mais facilidade de fazer isso, pois basta repetir o que ouvem (o que não garante que estejam afinados!), mas isso não significa que músicos de outros instrumentos não consigam.
Embora muitas pessoas possuam essa aptidão de forma inerente – frequentemente sem mesmo ter estudado música formalmente -, a habilidade pode ser desenvolvida e vários fatores estão envolvidos nessa prática.
Como qualquer linguagem, o aprendizado de música possui algumas etapas e, à medida em que o estudante as vence, fica mais fácil dominá-la. Ao fazer um paralelo com a língua materna, por exemplo, percebe-se que a criança, primeiramente, ouve os adultos falando, assimila essa linguagem e, aos poucos, pela tentativa de reproduzir o que ouve, balbucia algumas palavras até conseguir falar.
Algumas pessoas possuem o ouvido mais desenvolvido e esse processo é facilitado. Outras necessitam de mais treinamento, mas, com certeza, atingirão esse objetivo. Para facilitar e desmitificar esse processo, listamos aqui dez dicas para desenvolver essa habilidade e ter sucesso ao tirar músicas de ouvido.
Mas lembre-se: tirar músicas de ouvido é como aprender uma língua! Se a pessoa não conhece palavra alguma, não vai conseguir reproduzi-la, ou, se conseguir, não entenderá o que está falando. Por isso, alguns estudos são fundamentais.
1 – Ouvir
Mais do que tocar ou cantar, o estudante de música que quer “tocar de ouvido” deve aprender a ouvir música não apenas para apreciá-la, mas para perceber o movimento das notas, os padrões que se repetem, as modulações etc.
Para isso, deve começar escolhendo músicas que ele já ouviu muitas vezes. Quanto mais familiarizado com a música ele estiver, mais fácil será conseguir reproduzir o som que está ouvindo. Um ouvido atento é uma das principais ferramentas do músico.
2 – Identificar a primeira nota
Após escolher qual música vai utilizar para a prática, o primeiro passo é descobrir a primeira nota dela. Para isso, vale a pena utilizar um piano bem afinado.
Se o piano não estiver afinado no diapasão, a tonalidade pode não estar certa e a execução da música pode ficar bem mais complicada.
3 – Analisar o movimento da melodia
Depois de descobrir qual a primeira nota, é preciso entender se a próxima é mais aguda (movimento ascendente) ou mais grave (movimento descendente), e assim sucessivamente. De maneira geral, as melodias são construídas sobre graus conjuntos ou sobre arpejos dos acordes da harmonia.
Utilizar o piano permite conferir se a nota percebida está correta, além de dar uma ideia melhor de como a melodia se desenvolve.
4 – Identificar a escala e a tonalidade
As melodias são criadas, geralmente, a partir de uma sequência de notas a que se dá o nome de escala. Existem diversos tipos de escalas, das quais a maior e a menor são as mais utilizadas. Ao conseguir identificar qual escala está sendo utilizada e qual a tonalidade dela, fica muito mais fácil saber quais notas foram utilizadas para construir a melodia.
Quem conhece escalas consegue definir qual a tonalidade da música com apenas três ou quatro notas, por isso vale a pena conhecer bem esse fundamento. De forma geral, a primeira nota da melodia pertence ao acorde de Tônica da tonalidade (pode ser a fundamental, a terça ou a quinta). Melodias mais simples se mantém na tonalidade, sem acidentes ocorrentes.
5 – Ouvir a nota mais grave
Frequentemente, a primeira nota mais grave do acompanhamento, normalmente tocada pela mão esquerda do pianista ou pelo contrabaixo, é a Tônica da tonalidade da música, ou seja, a nota que deu origem à escala utilizada. Geralmente é a fundamental, mas também pode ser a terça ou a quinta do acorde.
Em harmonias mais elaboradas, ela pode até não fazer parte do acorde, mas é exceção à regra.
6 – Perceber a harmonia
Depois de reconhecer alguns trechos da melodia e as notas mais graves do acompanhamento, é momento de perceber qual a harmonia utilizada, ou seja, quais acordes acompanham a melodia.
Conhecendo a tonalidade, basta verificar o campo harmônico. Grande parte dos acordes utilizados pertencerão a esse campo harmônico.
7 – Verificar a progressão harmônica
Músicas mais populares geralmente seguem alguns padrões de encadeamento de acordes, ou seja, de progressões harmônicas. Vale a pena conhecer algumas e ver se elas podem ser aplicadas à harmonia em questão, como II-V-I ou I-IV-IV-V.
Conhecer as progressões harmônicas mais utilizadas facilita muito o trabalho.
8 – Analisar a forma
As músicas, de forma geral, seguem alguma estrutura, chamada forma, que a divide em trechos ou seções. Muitas delas possuem estrofes que se repetem e um refrão entre elas.
Analisar a forma da música e entender essas repetições é importante para economizar tempo.
9 – Perceber as modulações
As músicas nem sempre começam e terminam na mesma tonalidade. A mudança de tonalidade no decorrer de uma música dá-se o nome de modulação. Muitas vezes, a modulação se dá na repetição de uma estrofe ou do refrão e, frequentemente, pode ser percebida facilmente.
Modula-se, geralmente, para a tonalidade da dominante, da subdominante ou para graus conjuntos.
10 – Acertar o ritmo
Por vezes, o ritmo da melodia de cada seção ou repetição é um pouco diferente do de outras para que se adeque melhor à letra. É preciso prestar atenção e verificar se realmente essa alteração é necessária ou apenas um recurso.
Da mesma forma que na língua portuguesa, escrever o que se ouve é um ótimo exercício para assimilação. Além disso, escrever evita que, daqui a algum tempo, o músico tenha que reiniciar o processo para a mesma música. Dominar a escrita também auxilia a perceber os elementos musicais e reconhecê-los ao ouvi-los.
Com essas dicas, cada vez mais a percepção musical se desenvolverá e “tirar música de ouvido” no piano se tornará mais fácil. Tirar músicas de ouvido não é algo fácil no início, mas com treino e dedicação, qualquer músico consegue! E quanto mais se estudar sobre intervalos, harmonia, formação de acordes, escalas, arpejos e teoria musical, mais fácil será.