Sem dúvida os “Noturnos” de Frederic Chopin estão entre as obras mais conhecidas da literatura pianística. Mas o polonês não foi o único a compor nesse formato: a denominação “Noturno” foi muito utilizada durante o século 19 e posteriormente, até mesmo entre os compositores brasileiros mais contemporâneos.
Como o “Noturno” surgiu
O termo “Noturno”, no entanto, foi aplicado pela primeira vez a obras musicais no século 18, quando indicava uma peça em vários movimentos. Naquela época, a obra não era necessariamente evocativa da noite, mas poderia ser apenas destinada a uma apresentação noturna, como uma serenata, e depois deixada de lado.
Exemplos disso são a Serenata Noturna K. 239, a famosa Eine Kleine Nachtmusik (Pequena Serenata Noturna) K.525 e o Notturno em Ré, K.286 – que carrega o equivalente italiano, “notturno” – todas de Wolfgang Amadeus Mozart. A principal diferença entre a serenata e o “noturno” era o horário da noite em que normalmente eram realizados: a primeira por volta das 21h, a segunda perto das 23h.
Características do “Noturno”
Mas “Noturno” como peça de movimento único, geralmente escrita para piano solo, foi utilizado principalmente no século 19, como uma composição inspirada ou evocativa da noite. Os noturnos são geralmente considerados tranquilos, muitas vezes expressivos e líricos, e, às vezes, bastante sombrios.
Na prática, transmitem uma variedade de possibilidades, como sonhos, pesadelos, festas, arroubos românticos e contemplação, mas geralmente com característica serena, meditativa ou melancólica.
Os primeiros a serem escritos sob esse título específico foram do compositor irlandês John Field, considerado o pai do “noturno romântico”, compostos entre 1812 e 1836. Inicialmente denominados “Romance”, os Noturnos de Field tinham como característica a transposição para o piano da “cantilena” da ópera italiana e o uso do pedal de sustentação, o que permitiu ao compositor expandir o acompanhamento da mão esquerda além do Baixo Alberti.
Apesar de sua dedicação, poucos conhecem a obra de Field, pois o “Noturno” se tornou eternizado e extremamente identificado com Frederic Chopin, que deixou como legado 21 dessas composições, elevando o formato ao seu mais alto nível.
Chopin imprimiu aos seus noturnos uma intensidade dramática maior e desenvolveu um vocabulário harmônico mais sofisticado, complementado por um acompanhamento que evidenciava maior complexidade contrapontística.
Obras do “Noturno”
Talvez inspirados pela obra do polonês, muitos compositores escreveram noturnos, incluindo Franz Liszt (“En revê” e “Liebesträume”), Robert Schumann (“Nachtstücke” op.23), Clara Schumann, Carl Czerny (compôs 17 deles), Gabriel Fauré (escreveu 13), Francis Poulenc (oito) Louis Moreau Gottschalk, Erik Satie (cinco), Peter Ilitch Tchaikovsky, Nikolai Rimsky-Korsakov, Alexander Scriabin (escreveu quatro, incluindo um para a mão esquerda), Sergei Rachmaninoff (três), Edward Grieg, Claude Debussy, Ottorino Respighi e Samuel Barber (que escreveu um em homenagem a Field), entre outros.
No Brasil, praticamente todos os grandes compositores, de diferentes épocas e estilos, escreveram noturnos. É o caso de Carlos Gomes, Henrique Oswald, Alberto Nepomuceno, Heitor Villa-Lobos (“Hommage a Chopin”), Ernesto Nazareth, Radamés Gnatalli e Almeida Prado (que deixou 14 deles).
Os “Noturnos” fora do piano
Outros exemplos de noturnos incluem aqueles escritos para orquestra, como o de “Sonho de Uma Noite de Verão”, de Felix Mendelssohn, ou o conjunto de três noturnos para orquestra e coro feminino de Claude Debussy, cujo segundo, “Fêtes”, é muito animado.
O terceiro movimento do Quarteto de Cordas No. 2 de Alexander Borodin contém uma de suas mais famosas melodias, e é denominado “Noturno”. Antonin Dvorák compôs o “Noturno em Si Maior” para orquestra de cordas e Benjamin Britten escreveu um Noturno para tenor, sete instrumentos e cordas, além de o terceiro movimento de sua Serenata para Tenor, Trompa e Cordas também ser intitulado “Noturno”.
Nem mesmo a música popular ficou impermeável ao formato. Entre os pianistas que lançaram Noturnos em seus discos estão Joe Jackson, Billy Joel e Kate Bush, além do grego Vangelis.