Entre as muitas atividades que um pianista pode desempenhar, a função de acompanhador é uma das mais gratificantes e necessárias dentro do deslumbrante universo da música. Seja no campo erudito ou no popular, desempenhar esse papel é extremamente prazeroso, pela troca de experiências e pela cumplicidade existente entre os músicos.
O termo acompanhamento implica a existência de uma parte solista e outra parte que toca simultaneamente com a principal. Apesar desse papel aparentemente secundário, um pianista acompanhador precisa, além de dominar a base técnica e musical de um solista, extrapolar esses limites e se comunicar com outros instrumentistas, cantores e, até mesmo, orquestras e pequenos conjuntos, sejam eles músicos profissionais ou amadores.
Tanto o pianista solista quanto o acompanhador devem possuir habilidades comuns, como o conhecimento de estilos e formas, a qualidade do timbre e o domínio técnico do instrumento.
No entanto, há competências essenciais para o trabalho de pianista acompanhador que vão além, como boa leitura à primeira vista, conhecimento de harmonia, aptidão para trabalhar em equipe, flexibilidade, criatividade e capacidades de ouvir o outro, de reação, e de equilíbrio entre o piano e o solista, entre outras.
O piano e o papel do acompanhador
Um pianista acompanhador pode atuar em diversas áreas, como o trabalho instrumental, o vocal – incluindo coral – e, até mesmo, a dança. No primeiro caso, as possibilidades são inúmeras, desde acompanhar estudantes na preparação de obras, substituindo a orquestra, à construção de uma base sólida para que o solista se apresente. Também é comum o pianista acompanhar corais, tanto em ensaios quanto em apresentações. O mesmo ocorre em relação à dança, em que o piano, principalmente em se tratando de balé clássico, é a base rítmica para os ensaios.
O mais comum é vermos pianistas acompanhadores atuando ao lado de vocalistas, sejam eles eruditos ou populares. Em inúmeros casos, a presença desse profissional é fundamental para a expressividade do cantor, auxiliando-o em diversos fatores. Ao construir uma base sólida sobre a qual o cantor se sente seguro, tanto em relação à afinação quanto à métrica, o pianista o auxilia, inserindo elementos que valorizem a voz e a melodia ao mesmo tempo em que apresenta a harmonia.
Além de dominar seu próprio instrumento, o pianista acompanhador tem a tarefa adicional de adaptar sua sonoridade à de outro ou a uma voz, fundindo os papeis. É muito comum que ele tenha que se amoldar a diferentes tipos de instrumentista e repertórios em curtos períodos de tempo e com poucos ensaios. Por conta disso, ele deve ter um grande vocabulário musical, conhecendo diversos estilos, e a capacidade de reagir rapidamente a qualquer variação, ou mesmo erros, que o solista possa realizar durante a sua performance.
Sendo assim, pode-se imaginar que, além de sua própria parte, o pianista acompanhador deve conhecer bem a do solista, assim como as especificidades de cada instrumento, o que demanda mais estudo. Desde a respiração de um cantor, às arcadas de um violino ou os gestos de um regente de coral, é importante que ele tenha conhecimento de detalhes que podem auxiliar – ou comprometer – a performance.
É comum que um pianista acompanhador atue, num curto espaço de tempo, com instrumentistas diferentes tocando as mesmas músicas. Ele deve, portanto, ter a capacidade de se adaptar às diferentes características de cada um deles e dos detalhes de cada interpretação. Além disso, ele deve saber lidar com uma grande variedade de personalidades.
Entre as habilidades mais específicas – e musicais – de um acompanhador, consta também a habilidade de transposição. Geralmente, esta é uma competência mais utilizada pelos acompanhadores de cantores, pois o pianista tem que se adaptar à tessitura ou ao tipo de voz do solista. E a dificuldade não é apenas uma questão de notação, mas uma questão de técnica pianística, pois cada tonalidade implica em novo dedilhado.
Por outro lado, pode ser necessária, muitas vezes, uma simplificação de alguma passagem, de forma a não comprometer a qualidade musical, mas permitir a execução, principalmente quando o tempo de ensaios é exíguo.
Ao trabalhar em prol da arte de um solista, o acompanhador, frequentemente, abre mão de seu protagonismo. Por conta disso, é raro que um ótimo pianista solista seja um bom pianista acompanhador. Mas bons exemplos não faltam, desde Cesar Camargo Mariano, ao lado da inesquecível Elis Regina, aos mais modernos, como Jether Garotti, sideman de Zizi Possi.